Belo Horizonte recebe exposição “Nossa Modernidade”em homenagem a Yara Tupynambá
Além de obras da artista mineira, a mostra expográfica traz uma seleção de mais de 100 trabalhos de 59 artistas de diferentes fases da expressão modernista em Minas e no Brasil, entre eles, Di Cavalcanti, Portinari, Poteiro, Ismael Nery, Tomie Ohtake, Cícero Dias, entre outros.
“O termo modernidade não é uma variante de modernismo, que, no Brasil, designa um movimento específico, que tem até data de nascimento: fevereiro de 1922, com a Semana de Arte Moderna em São Paulo. Claro que marcos desse tipo são simbólicos e pretendem facilitar a leitura da própria História. Mas nesta mostra, por modernidade desejo designar um dado espírito atemporal, mas também e, sobretudo, a produção artística que, partindo daquele modernismo, perpassa o século XX e se prolonga até os dias atuais”, contextualiza o curador Olívio Tavares de Araújo.
“A Semana de 22 foi um movimento da elite paulistana patrocinado pelos barões do café; o pai da própria Tarsila possuía 32 fazendas no interior do estado. Artistas proletários, imigrantes ou filhos de imigrantes, bem menos vanguardistas e que viviam de ofícios correlatos, ficaram marginalizados”, pontua.
Olívio relata que os modernistas “não oficiais” reagiram à exclusão, em 1935, com a criação do Grupo Santa Helena, ao qual pertenceu Clóvis Graciano, um dos artistas presentes na mostra. “A História registra ainda um terceiro momento modernista, que traz a política à pintura. Portinari figura como o grande pintor engajado dos anos 30 e 40, autor de obras de denúncia. Lívio Abramo, outro grande expoente, por fazer gravura, aparece muito menos”, exemplifica.
Se a Semana de 22 dá luz ao Modernismo, pode-se dizer que a primeira Bienal de São Paulo, inaugurada em 1951, representa a data de batismo das tendências abstratas. A primeira a se impor foi a geométrica, estilo representado na mostra “Nossa Modernidade” por Ivan Serpa, um dos precursores no Brasil. Olívio comenta: “existe uma teoria segundo a qual os países latino-americanos, em resposta à entropia tropical e à desorganização (inclusive política) em que vivem mergulhados, possuem uma ‘vocação construtivista’, uma arte ‘limpa’, feita antes com a razão do que com a emoção (objetiva e progressista), mas que estaria mais em sinergia com o momento desenvolvimentista da nação brasileira: a implantação da indústria automobilística, a construção de Brasília, etc.”.
Porém, Ivan Serpa também experimentou, segundo Olívio, o figurativo e, no início dos anos 1960, o que foi nomeado como sua “fase negra”: pintura sem cor, ostentando enormes rostos femininos no mais vigoroso gestual expressionista, terrivelmente deformados, quase assustadores. “Como contribuição à história da arte em Minas, conto-lhes que Chanina ficou vivamente impressionado com uma pioneira exposição em Belo Horizonte da fase negra (tão oposta à sua pintura), veio comentá-la comigo e depois pintou um pequeno quadrinho expressionista, que me deu de presente. Deve ser único em sua produção”, recorda.
Na década de 60, a geometria dá lugar ao abstracionismo informal, também chamado tachismo ou abstracionismo lírico, constituído por gestos e manchas de cores flutuantes no espaço da tela. A força e qualidade do estilo está expressa sobretudo em trabalhos dos nipo-brasileiros Manabu Mabe, Tomie Ohtake e Kazuo Wakabayashi.
Outra revelação da mostra é a arte do italiano Ernesto de Fiori. Pintor e escultor da maior importância, pouco conhecido em Minas, com sólida formação alemã, fixou-se no Brasil em 1936, no exato momento em que o Grupo Santa Helena vinha ao proscênio. Imigrante e fortemente marcado pelo expressionismo, De Fiori tinha mais afinidades com este primeiro grupo do que com os modernistas “oficiais”, cuja matriz era cubista. “
Um dos pontos altos da mostra, segundo Olívio, são os desenhos de Ismael Nery. “Já tão vistos, tão parecidos entre si, e sempre implacavelmente perfeitos. Sabe-se que Picasso exigia da mão do desenhista que cantasse, e é o que a de Nery faz”, comenta. Outro destaque é a coleção de obras da vigorosa figuração dos anos 70, representada por Siron Franco, Roberto Magalhães e João Câmara. “Câmara é o autor da ambiciosa e totalmente bem-sucedida série `Cenas da Vida Brasileira’: dez telas e cem litogravuras com imagens simbólicas situadas no tempo do Estado Novo, que, na verdade, faziam oposição à ditadura militar então vigente”, pontua.
Chamam a atenção durante a visitação, segundo o curador, trabalhos dos mineiros Amílcar de Castro, Marcos Benjamim e Roberto Vieira. Citando o jornalista, poeta e crítico carioca Roberto Pontual: autores de obra “incondicionalmente mineira”. Para concluir, o curador Olívio Tavares de Araújo comenta a homenagem à artista Yara Tupynambá. “Dama das artes de Minas Gerais, eterna artista, Yara Tupynambá trouxe robusta contribuição cultural em toda sua trajetória, seja com a elaboração de grandes murais tombados pelo Patrimônio Histórico, seja pela formação e orientação técnica de artistas e pessoas em cursos de história da arte e também pelo reconhecido trabalho de identificação e valorização dos valores e riquezas de Minas Gerais”.
SERVIÇO
EXPOSIÇÃO NOSSA MODERNIDADE
31 de outubro a 20 de novembro de 2023
De segunda a sexta – 10h às 18h
Sábados – 10h às 13h
Local: Errol Flynn Galeria de Arte
Rua Curitiba, 1862 / Lourdes
Entrada Gratuita